Don’t mention lupanar

Nada há que se compare a um jantar impregnado de jornalistas, para se ter acesso ao retrato cru e razoavelmente fidedigno do recreio político que se vai desenrolando, sob o quotidiano dito «normal» de milhões de constituintes, no seio dos partidos políticos (também conhecidos como «aparelhos».)

Ouvimos e pensamos: «não pode ser assim tão mau». Pois não: é pior.

Desde logo, a valsa não é lenta: a conflagração marca o ritmo, a parlapatice é generalizada, a tensão é a pedra de toque.

Tráfico piramidal de apoios, compra de votos, caciquismo em roda livre, golpadas palacianas, facadinhas nas costas, denuncias, traições e bufaria: há de tudo um pouco. A natureza humana em todo o esplendor.

Há gente que não distingue uma azinheira de um sobreiro; um borrego de um cabrito; uma função logarítmica de uma exponencial; uma taxa de um imposto; a tabela periódica de uma tabela de básquete; Racine de Estaline; ou que fala, com o ar mais sério do mundo, em «crescimento negativo» e «empoderamento». Mas é observá-los nas alamedas e interstícios partidários: virtuosos do calculismo, mestres da encenação, maquiavéis na disputa, formiguinhas laboriosas e criativas, pequenos e adoráveis déspotas nas «concelhias» (circunscrições que não implicam grandes «inteligências», apenas o tempo e a dedicação próprias de quem não tem uma profissão «cá fora»).

Regra geral, todos os partidos produzem e pastoreiam certo tipo de «funcionários»: treinados, desde tenra idade, no campus das jotas; hábeis no contacto com «as bases»; proprietários de três ou quatro ideias vagas sobre «ciência política» (normalmente apreendidas nas universidades de Verão ou num transitório e louvável esforço autodidacta); especialistas nas «inscrições compulsivas» e na actualização criativa de «cadernos». Gente muito animada, que faz questão de se «inscrever» na sociedade.

No meio da lufa-lufa, há registos de relativa acalmia, onde valores mais altos concorrem para a arregimentação e aguçam a concentração: nas vésperas da corrida ao poder (a união faz a força) ou depois da tomada deste (oba, oba). Sobretudo neste último caso.

É por demais sabido que estados de má nutrição, provocados por períodos de prolongada carência, são propícios à acrimónia, à ansiedade e à irreflexão. A chegada ao poder é uma espécie de plaina conciliadora: as arestas são removidas, as disputas afagadas, as excrescências opiniativas desbastadas, o nervosismo nivelado para níveis aceitáveis. É o tempo do amanho e da nutrição.

Isto tem mal? Não teria. O problema é que destas nebulosas sai gente que vai ocupar cargos de chefia, direcção e governo, com uma visão muito estreita do que é a política, o convívio democrático e, em última análise, o país real. O caldo iliberal, anti-democrático e acintoso que os alimentou, produzirá os seus efeitos na forma como se relacionam, como expõem os seus argumentos, como respeitam (ou não) a sua independência e a sua liberdade. Se isto não é trágico, anda lá muito perto.

Estarei eu a abraçar um discurso perigosamente generalizador, e por isso injusto e populista?  Call a lawyer and sue me.

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2 thoughts on “Don’t mention lupanar

  1. Não deixando de sentir como verdade muito do que diz, defendo que o cidadão individual tem que assumir as suas responsabilidades e não arranjar desculpas de mau pagador. Quem os coloca lá, tem que ser tratado como cumplice não como vitima.

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