Taxistas de todo o mundo, uni-vos!

Theodore Dalrymple fez o elogio dos taxistas: gente normalmente bem informada, com uma visão muito clara da natureza humana, sem concessões ao cinismo e ao sentimentalismo.

Concordo e, de forma imodesta, confesso-me: paulatinamente, com o avançar dos anos, tenho vindo a consumar um trade-off metodológico entre a politologia anódina de salão, que durante anos nutri sob notável esforço autodidacta, e um comovente apego a formas mais ou menos abruptas de taxismo, doutrina injustamente vilipendiada por flocos de neve, políticos em geral e gente cuja auto-estima foi barbaramente violentada num qualquer trajecto aeroporto-baixa.

Dito de outra maneira: a idade subtraiu-me a sofisticação que subordina a liberdade ao fim estético, mas compensou-me com o melhoramento de uma técnica analítica de perscrutação das misérias humanas e da pantominice, filha maior do senso comum e do cepticismo. Estão a ver aquele ditado «a conservative is a liberal mugged by reality»? Pois é: fui assaltado vezes de mais.

Noutros tempos, este desvio na direcção de ordens filosóficas de raiz, digamos, mais popular, ter-me-ia levado ao degredo e à vergonha. Com o passar dos anos, abracei com convicção uma atitude eminentemente «básica» de desprezo pelo «homem público» e de desconfiança pelo que me rodeia. Graças a Deus por isso.

Impõe-se, nesta fase, uma palavra de agradecimento aos responsáveis por esta deriva analítica: os políticos do meu país.

Os trágicos acontecimentos das últimas semanas escancararam a céu aberto a impreparação, a mendacidade e o foguetório de hipocrisia de uma classe que nos devia respeitar e servir e pouco mais faz do que jogar: jogar com as palavras, jogar com noções básicas de honestidade, jogar com a inteligência alheia, jogar com os sentimentos. Tudo muito previsível, infantil e nauseabundo.

Observar a reacção dos líderes do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista aos incêndios, hoje, comparando-a com a reacção dos mesmos actores há dois anos, é constatar a existência de criaturinhas que por cupidez ou tacticismo fazem questão de chafurdar na pocilga da desonestidade intelectual. Escutar Passos Coelho sobre putativos suicídios durante uma visita a Pedrógrão Grande, ou assistir ao degradante espectáculo de governantes agarrados que nem lapas à «imprevisibilidade» de raios e a «inauditos» downbursts com o intuito de esconder clamorosas falhas dos serviços que tutelam, é um fortíssimo contributo para a industria dos antieméticos.

Questionamo-nos: que gente é esta? Da chincana política à postura de bullies; da impreparação e cobardia, à mendacidade e à dissimulação; a resposta é óbvia e definitiva: a pior geração de políticos do Portugal democrático.

Dizer isto é um exercício simplista de generalização, demagógico e injusto? É a vida.

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