Agrada-me a divulgação televisiva de interrogatórios judiciais em prime, middling ou off-peak time? Não.
A divulgação dos interrogatórios roça o voyeurismo? Roça.
A divulgação dos interrogatórios constitui um crime? Provavelmente, sim.
Tratando-se de um crime, a divulgação dos interrogatórios, com o devido tratamento jornalístico, pode, ainda assim, justificar-se? Depende do processo e do tratamento jornalístico.
Se estiveram em causa crimes de corrupção e conexos que tenham prejudicado a res publica, desprestigiado a classe política e abanado os fundamentos do Estado de Direito, poderá o interesse público, o dever de informação e a liberdade de imprensa, enquanto direitos fundamentais consagrados nos artigos 37.º e 38.º da Constituição da República Portuguesa, sobrepor-se ao direito à reserva da intimidade da vida privada e ao direito à imagem, protegidos constitucionalmente no n.º 1 do artigo 26.º da mesma Constituição? Na qualidade de indigente não-constitucionalista, penso que sim.
Podemos visionar a peça jornalística da SIC e unicamente concluir, ou dela retirar, a existência de uma flagrante e «nojenta» violação do disposto no número 2 do artigo 88.º do Código do Processo Penal? Podemos, da mesma forma que podemos achar que The Love Song of J. Alfred Prufrock é um divertido poema sobre o lamento de um procrastinador que não consegue pedir em casamento a sua amada, às voltas com uma overwhelming question; ou que Moby Dick relata as andanças de um baleeiro dirigido por um valente capitão, levemente lelé da cuca; ou que o The Catcher in The Rye é uma comédia sobre um puto de 16 anos que disfarça a queda para o ócio e o enjoo à instrução com supostas perturbações mentais; ou que Bartleby, The Scrivener narra as desventuras de um ardiloso calão.